Oito milhões escorrendo pela Avenida Sapucaí
Apois o debate está animado com a notícia de que a prefeitura de Maceió vai enviar à escola de samba carioca Beija-Flor a módica quantia de R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais) para o nome da capital alagoana sambar na Sapucaí no Carnaval de 2024.
Exsuda emoção da crítica ou do apoio ao dispêndio. Quem aplaude justifica que “vai impulsionar o turismo em Maceió”, e “é até pouco para a projeção”. As vaias dizem “é jogar dinheiro fora”, e “antecipação da campanha eleitoral”. É samba na língua!
É UMA AJUDA ESPECIAL AO TURISMO?
Sim, é uma ajuda muito especial ao turismo... carioca. R$ 8 milhões é sopa no mel para o glamour da festa no Rio de Janeiro, pois enriquece ainda mais o Sambódromo, impulsionando com força o luxo de uma das escolas mais ricas de lá.
Além das “oito milhas” despejadas na Sapucaí, haverá uma multiplicação do número de turistas vindos de Alagoas que aterrissarão no Rio de Janeiro com disposição para gastar o que podem e o que não podem – para ver a Beija-Flor sugar o néctar maceioense.
E O TURISMO AQUI, GENTE?
Vai muito bem, obrigado. O turismo em Maceió cresce solto há décadas. Se for para trazer mais visitantes, será dinheiro jogado fora, pois a rede hoteleira maceioense está topada desde muito antes do bico da Beija-Flor ser adoçado com essas oito cocadinhas.
Segundo o site da prefeitura de Maceió, em 2020, a ocupação no Réveillon foi de 85%; no Carnaval de 2022 foi de 80%; em janeiro de 2023, 100% (!); neste feriadão da Semana Santa, 90%; 1º de maio deste ano, 96,5%... não temos mais onde botar turista!
BEIJA-FLOR OSCULA DINHEIRO?
Vender o enredo não é acusação nova para a grande escola de Nilópolis, e a ocorrência mais cabeluda está registrada no Carnaval de 2015, quando “inexplicavelmente” a ditatura da Guiné Equatorial brilhou de azul e branco na avenida da antiga Capital Federal.
“Um griô conta a história...” assim iniciava o tema da Beija-Flor que passou o pano, há nove anos, para Teodoro Mbasogo, ditador da Guiné Equatorial desde 1979, dedurado pela Forbes como o governante mais rico do mundo (e de um dos países mais pobres no planeta).
RÁS GONGUILA RASGA SEDA?
Única vantagem nesse baticum é a lembrança de Rás Gonguila. Benedito dos Santos (1905/1968), era negro, pobre, sapateiro, carnavalesco, gozador e passista (não era sambista). Brilhou no carnaval maceioense, abaixo apenas do Moleque Namorador.
Se o enredo de oito milhões de reais homenageasse os dois – Rás Gonguila e Moleque Namorador – teria sido mais leal à memória no Carnaval maceioense, pois ambos eram os reis da folia na Capital alagoana. Mas a rasgação de seda, na vera, é outra.
QUEM GANHA COM ESSE AUÊ?
Até prova em contrário, pois atrair turistas com desfile de escola de samba é tapia, quem vai se beneficiar mesmo com esse investimento é a candidatura do prefeito à reeleição, pois o voo da Beija-Flor vai produzir uma enxurrada de cenas para a campanha.
Efêmeros são os desfiles. Explodem e somem – salvo exceções. Lembra-se da campeã do ano passado? Lembra-se do enredo 2023 da Beija-Flor? A meta desse investimento não é a divulgação fora de Alagoas, e sim a propaganda eleitoral antecipada em Maceió.
MACEIÓ FALANDO PARA O MUNDO?
Investir em campanhas permanentes é importante, mas o efêmero some no ar. Praias, lagoas, culinária, hospitalidade são os motes do samba-enredo alagoano há décadas. Mantendo isso, podem ampliar sem medo o número de leitos; e sem desperdiçar dinheiro.
E faço um desafio: não sei quando custou aquela cadeira-gigante, creio que uma ninharia; mas aposto que o monumento banal à beira da praia de Pajuçara (mérito de JHC) divulga muito mais o destino Maceió e atrai mais turistas que dez desfiles na Sapucaí.
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