Anália, o banco e o bordel
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Há coisa de quatro décadas, numa das regiões mais desiguais do Planeta, uma mulher chamada Anália – não aquela de Caymmi, que não foi para Maracangalha; mas outra – ousou negociar com o maior banco local e, com inteligência e sagacidade, deixou uma lição inesquecível sobre moralidade e poder.
Proprietária da boate “Naná Drinks”, ela enfrentava dificuldades financeiras quando propôs o parcelamento de suas dívidas, que somavam cerca de 4 milhões da moeda da época. Um perito foi designado para avaliar sua capacidade de pagamento e elaborou um relatório que se tornaria lendário – não pelos números, mas pelas descrições tão vívidas que quase fizeram os funcionários do banco se engasgarem de rir.
Um dos chefões, no entanto, considerou o relatório “incompatível com o linguajar polido e a sobriedade da Casa”. Mas a questão crucial permanecia sem resposta: Anália teria ou não condições de pagar?
A “Naná Drinks”, eufemismo para suavizar expressões menos diplomáticas como bordel, cabaré ou rendez-vous, ocupava um antigo prédio de alvenaria com sete cômodos, afastado da zona oficial de prostituição. A proprietária liderava “um plantel” de seis jovens entre 18 e 21 anos que cumpriam uma jornada de trabalho ditada pela demanda. “Toda hora é hora, todo dia é dia”, registrou o perito, com um toque irônico.
Segundo ainda o perito, os frequentadores eram figuras influentes da região e visitantes ocasionais, atraídos não só pela localização estratégica – distante 20 km do centro da cidade, à margem da rodovia federal –, mas também pelo prestígio do estabelecimento. E não apenas isso, supõe-se. O faturamento impressionava: o rendimento mensal ultrapassava 1,2 milhão, com uma margem líquida de cerca de 400 mil após o pagamento de despesas como aluguel, água e energia, além das tarifas dos “serviços prestados pelas meninas”.
Apesar dos números, o histórico de Anália preocupava. Sua imagem junto ao banco não era tão boa quanto a que desfrutava no ramo explorado. As dívidas vinham de financiamentos rurais subsidiados para plantio de arroz, milho e mandioca – valores desviados para um “negócio mais lucrativo”: a boate que deu origem à “Naná Drinks”, inicialmente instalada nos arredores de um povoado próximo. Percebendo o movimento fraco naquela localidade, Anália transferiu a “operação” para a cidade onde estava sua agência bancária, um mercado em “franca evolução”.
O laudo do perito concluía que Anália, agora bem mais estruturada, poderia quitar suas dívidas sem os riscos de adversidades climáticas inerentes à região. Mas o chefão que torceu o nariz para o relatório, zelando pela imagem do banco (ou a própria, talvez), negou o parcelamento e encaminhou o caso para a Justiça – caminho que só agrada mesmo advogados e meirinhos.
Mas Anália não era mulher de aceitar um “não” sem luta. Dias depois, foi pessoalmente ao banco. O chefão, acomodado em sua poltrona de couro, tragou o cigarro sem pressa, como quem saboreia o prazer de negar:
– Agora, a senhora deve procurar seus direitos na forma da lei.
– Claro, senhor, mas podemos conversar olho no olho? Só um minutinho...
– Tudo bem, mas só decidimos com base em fatos e documentos…
Com um gesto descuidadamente teatral, Anália abriu a bolsa e deixou algumas fotos caírem no chão, entre cartões, chaves e cheques. O chefão, intrigado, arregalou os olhos ao ver nas imagens figuras conhecidas. Entre elas, ele próprio, bem acompanhado, nu cintura acima, segurando um copo de uísque.
– O que diabo é isso? – gaguejou, sentindo o chão lhe faltar.
– Ah, me desculpe, senhor. São recordações dos clientes da “Naná Drinks”. Um jornalista quer fazer uma reportagem sobre nossa boate e devo me encontrar com ele daqui a pouco...
O silêncio pesou. O chefão, antes tão seguro, agachou-se para recolher as fotos com mãos trêmulas. Conferia uma a uma, como se pudesse apagá-las apenas olhando:
– Veja como são as coisas… Como somos irresponsáveis depois de algumas doses, hein?!
– Se o senhor quiser, pode ficar com elas. Nem se preocupe com os negativos, eles estão bem guardados no meu cofre.
O chefão ajeitou o colarinho e, sem encarar Anália diretamente, abreviou a conversa:
– Bem… Podemos rever a decisão. Tudo dentro das normas, é claro!
Meia hora depois, Anália tinha em mãos o novo contrato, assinado, e uma lição a ser compartilhada com suas colegas de trabalho sobre hipocrisia e moralidade seletiva: certos homens só enxergam aquilo que ameaça a seriedade que fingem ostentar. E no mundo dos que pregam a virtude, o verdadeiro poder está com quem conhece as regras – e ousa usá-las a seu favor.
Os tempos mudaram, mas a essência humana, não. Anália saiu satisfeita. Na porta do banco, respirou fundo, ajeitou o vestido e sorriu. No teatro da moralidade, afinal, quem manda não é quem veste terno e gravata, mas quem conhece os bastidores.
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