Cultura
Da imigração maciça, um novo fluxo de artistas revela a diversidade culturalm novo fluxo de artistas revela a diversidade cultural
Um movimento que, de certa forma, já se naturalizou na dinâmica brasileira é o êxodo de nordestinos para o Sudeste. Em busca de melhores oportunidades, muitos deixaram (e ainda deixam) seu lugar para tentar a vida em outra região. No campo da música, esse movimento também é marcante.
Especialmente nas décadas 1960 e 1970, podemos apontar alguns exemplos relevantes desse intenso fluxo: os baianos que fizeram a Tropicália – Caetano, Gil, Gal, Tom Zé, além de Maria Bethânia –, o chamado “Pessoal do Ceará – Belchior, Amelinha, Ednardo, além de Fagner –, assim como os pernambucanos Alceu Valença, Geraldo Azevedo, os paraibanos Elba e Zé Ramalho, Cátia de França.
Foi a mãe de Giovani que lhe falou: “Melhor você ir fazer o que você quer do que você morrer igual a muitos da gente, com o sonho abafado, com o sonho mastigado”, lembra. Em 2017, fixou-se na cidade. Então, ele desbravou Sampa e foi atrás de construir sua história.“Primeiro, fiquei morando na casa dos outros, morando em vários sofás”. Mas, conseguiu achar um caminho a seguir. Atualmente, Giovani possui quatro álbuns lançados e excursiona Brasil afora, mesmo que ainda no esquema independente, mas, com muito mais estrutura e suporte do que se ainda estivesse em Salvador.
“São Paulo não é exatamente uma cidade dos paulistas. É uma cidade que tem muita gente de todo canto lá”, diz Giovani, que procurou também se cercar de pessoas de outros lugares do Brasil que não necessariamente São Paulo, também como uma forma de driblar as adversidades. “Sempre há algum preconceito com quem é de fora, baiano, preto. Existe uma falsa cordialidade. Eu sei que em alguns lugares eu sou aceito porque tô com um violão na mão, porque conheço A, B ou C, mas eu sempre superei isso”, conta.
“A minha música foi bem acolhida em SP. Eu sempre me senti meio peixe fora d’água em Salvador, talvez porque minha música não tava muito ligada a essa coisa da festa, do Carnaval (...) esteticamente, artisticamente, eu me afinava com as pessoas que estavam em SP”, destaca Giovani.
“Eu tô em São Paulo por conta de trabalho mesmo. Você sabe que a grana tá no Sul. A grana, as pessoas que consomem. A minha cidade que eu gosto mesmo é Salvador, a Bahia”, exalta.“Enquanto eu puder estar perto da praia, da natureza, da minha natureza, com meu Oxóssi, eu estarei”, diz Giovani, que, atualmente, se alterna entre temporadas em São Paulo e em Salvador.
De Juazeiro para a PaulicéiaTambém baiana, de Juazeiro, a cantora e compositora Josyara botou os pés na Paulicéia pela primeira vez, em 2014, aos 22 anos. “Vim acompanhando uma ex-namorada para um congresso estudantil”, lembra. Foi passar uma semana, acabou se estendendo por dois meses, fazendo contatos. “Naquela semaninha, eu queria tentar, sei lá… na minha cabeça de novinha, tentar conhecer algum músico, naquela esperança de que ia achar alguma coisa… e acabei achando”, lembra.
Depois disso, foi à terra natal buscar suas coisas e ir de vez para Sampa. “Fui sozinha, não tinha banda, mas fui conhecendo as pessoas, fazendo o que eu tava querendo. Em pouco tempo, eu já tava fazendo barzinho, tocando com músicos daqui”.
Josyara toca profissionalmente desde os seus 15 anos de idade – quando recebeu seu primeiro cachê. Já teve uma banda de rock, chamada Psíncope. Como artista solo, ela assinava Josy Lélis. Com um disco, “Uni Versos”, lançado em 2012, com patrocínio da Petrobras, tocava em barzinhos e casas noturnas em Salvador, no interior do estado – Bom Jesus da Lapa, Irecê, Juazeiro etc.
Hoje, com três álbuns (um deles dividido com Giovani Cidreira), Josyara percebe que a grande diferença de estar morando em SP foi a profissionalização que envolveu o seu ofício. “Isso foi ficando mais claro, fui vendo a necessidade de uma equipe, de banda, de organização”, conta. Em São Paulo, ela contou com uma rede de amigos que foi se ampliando cada vez mais. Mas, ainda assim, ainda teve de lidar, mesmo que de forma velada, com preconceitos e discriminações.
“Tem essa coisa da xenofobia. De fazer uma piada, uma imitação do jeito que eu falo, questionar se eu era realmente de Salvador, porque eu falo ‘ti’ e ‘di’. E também por ser negra. Juntou essa intersecção toda. Eu fui vendo e percebendo esse tipo de olhar, como quem diz: ‘o que você tá fazendo aqui nesse mercado chique de Perdizes?’”, conta.
Mas, resistiu. “Tinha um lugar dessa jovem mais raivosa, que enfrentava isso. Se diziam que não era pra eu estar ali ou fazer algo,aí é que eu ia e fazia mesmo. Tinha essa coisa mesmo dessa raiva, desse enfrentamento. Claro que tinham uns sentimentos de vulnerabilidade também, mas é muito a coisa da resistência mesmo, dos nossos antepassados, dessas coisas que nos conectam”
Há quase 10 anos na cidade, Josyara não dispensa as idas para a Bahia, nos períodos de Verão. “Esses retornos acabaram virando um equilíbrio, um respiro, uma necessidade pessoal mesmo, de matar a saudade, reenergizar”.
*Folhape
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