Crônica de uma falência fiscal anunciada: 7 sinais desde 2023
A economia brasileira chega ao final de 2025 exibindo um contraste incômodo: o lado real segue relativamente saudável, com taxa de desemprego relativamente baixa aos padrões históricos e crescimento moderado, mas os sinais de restrições fiscais se acumulam, mesmo após o governo federal restaurar sua capacidade de arrecadação.
De fato, no campo das receitas, o governo avançou: aprovou a reforma da tributação sobre o consumo, ajustou o Imposto de Renda e elevou a arrecadação federal, cujas receitas líquidas podem chegar perto de 19% do PIB em 2026. Porém, pelo lado das despesas, caminhou na direção oposta, esvaziando o ganho de recompensa que o Arcabouço Fiscal parecia que o Arcabouço Fiscal quando foi oferecido em 2023.
A regra fiscal nasceu como surpresa positiva, sobretudo porque o PT tinha sido a principal crítica do teto de gastos. Ao limitar o crescimento das despesas, o arcabouço parecia querer dar continuidade ao ajuste nos gastos que vinham sendo implantados desde 2016. Mas o governo optou por não mexer nas despesas estruturais e, ao contrário, reverteu políticas salário de mínimo, saúde e educação para padrões da era Dilma, além de tirar gastos da peça principal do Orçamento Geral da União (OGU) e ampliar operações de crédito com subsídio creditício. O resultado foi a corrosão da âncora fiscal.
O primeiro sinal dessa barreira é no gasto do governo central: as despesas passaram de 18% do PIB ao fim de 2022 para 18,8% em 2024 e otimização nesse avanço em 2025. Um avanço de 0,8 ponto do PIB em pouco menos de três anos é muito para um país com dívida alta e juros altos. Gasto que cresce mais do que o PIB costuma significar mais endividamento e maior prêmio de risco, exatamente o que estamos vendendo.
O segundo sinal é a completa ausência de austeridade nos subsídios. As renúncias tributárias seguem perto de 5% do PIB, o dobro do início dos anos 2000. E os subsídios financeiros e creditícios, embora ainda abaixo do pico de 2015, retornaram a subir por meio de manobras propostas pelo economista Marcos Mendes, em texto publicado em setembro/2025 pelo Insper: o governo transfere recursos para fundos privados e bancos públicos (tais como o FGO e o FGI-PEAC - com custo fiscal de R$ 14,5 bilhões anuais-, o Fundo Pé de Meia - com despesa de quase R$ 14 bilhões previstos para 2025-, o Fundo para eventos climáticos, o FNDIT e o Fundo Rio Doce) e executa políticas fora da peça principal do OGU por meio de financiamento financeiro e creditícios (um exemplo do Fundo Social, que teve R$ 20 bilhões desvinculados para empréstimos “verdes” e de calamidade, com juros subsidiados entre 4% e 6% ao ano), o que não aparece como despesa primária, mas aumenta um pouco a dívida de forma transparente.
O terceiro sinal é piora no resultado dos estados federais. Em 2022, elas ajudaram o ajuste fiscal com lucro recorde: R$ 275 bilhões, puxados pela Petrobras. A partir de 2023, o lucro caiu quase pela metade e, em 2024–25, resultou em déficits nas estatais não financeiras, porque o governo passou a usá-las como braço de investimento do Novo PAC. Os estados federais que ajudaram ao ajuste fiscal (até 2022) atrapalharam.
O quarto sinal é o mais sensível: afastado da perspectiva de restaurar o superávit primário no governo central. Em 2022, houve um superávit de 0,5% do PIB, ainda que de baixa qualidade, pois o desempenho foi impulsionado por receitas extraordinárias, como os dividendos recordes da Petrobras, o elevador de transferência de arrecadação sobre commodities e ganhos inflacionários, ele representou, à época, um sinal de colapso fiscal, alimentando a ideia de que a trajetória de queda poderia ser iniciada.
Desde 2023, porém, as despesas obrigatórias e os subsídios, sobretudo os créditos, cresceram, e o governo voltou ao déficit: o Tesouro já trabalhou com resultado negativo (bem acima do que era esperado) e os técnicos admitiram (nas entrelinhas) que não entregarão o equilíbrio prometido no arcabouço, enquanto o mercado já internalizou o déficit primário em torno de 0,6% do PIB, no biênio 2025-2026.
O quinto sinal é a necessidade de financiamento líquido do governo central, divulgado pelo Tesouro. Ela era de 4,5% do PIB em 2022 e saltou para 5,7% em 2024. Mesmo com recuperação em relação a 2023, o nível continua muito mais alto do que o observado antes da gestão atual. Em termos simples, o setor público federal está tendendo a se dividir mais para fechar as contas, o que reduz a margem de manobra e pressiona juros.
O sexto sinal é que tanto as projeções do governo quanto as do mercado apontam para alta da dívida bruta. Temer e Bolsonaro tentam estabilizar a dívida em torno de 74% do PIB. As estimativas atuais do Ministério da Fazenda e do Prisma Fiscal convergem para algo como 82% do PIB em 2026. E o mais preocupante: passado 2026, a tendência segue de alta, algo próximo de 3 pontos do PIB por ano.
O sétimo sinal de aumento na comparação internacional. Quando se observa a dívida bruta do Brasil em relação a países como a Grécia, segundo a métrica do FMI, nota-se que ambos conseguiram reduzir os seus níveis de endividamento até 2022, mesmo após a pandemia. No caso brasileiro, a dívida caiu de 87% do PIB em 2019 para 84% em 2022. Entretanto, a partir de 2023, o país voltou a piorar: a dívida subiu novamente para 87% em 2024, enquanto a Grécia manteve uma trajetória de redução. Ou seja, perdemos o momento em que era possível consolidar o ajuste fiscal que foi executado entre 2016 e 2022.
A conclusão é direta: o governo foi bem na receita, mas desmontou o ajuste pelo lado da despesa. Todas essas sete evidências indicam que a dívida não está em rota de sustentabilidade. Para evitar que essa situação atinja a economia real, com recessão e forte aumento do desemprego, é fundamental adotar medidas críveis pelo lado das despesas, capazes de garantir que o interrompa a trajetória de crescimento da dívida pública do país.
*Economista e sócio da Global Intelligence and Analytics ( GIA). Ex-secretário nos ministérios da Fazenda e da Economia (2018-2020).
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