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O Valor do Conhecimento: A Teoria do Capital Humano de Theodore Schultz e Gary Becker

14/01/2025 12h12
O Valor do Conhecimento: A Teoria do Capital Humano de Theodore Schultz e Gary Becker

Desde os primórdios da história, o valor do capital humano, representado pelo conhecimento, evoluiu conforme as necessidades de cada época. Mas foi com o advento do sistema capitalista, que o conhecimento adquiriu importância fundamental.

Muitos economistas do passado, como Adam Smith, Karl Marx e Alfred Marshall, já buscaram explorar o impacto do capital humano nos processos socioeconômicos, porém não conseguiram desenvolver um modelo analítico sistemático. No entanto, foi apenas na década de 1960 que a Teoria do Capital Humano ganhou forma e efetividade. Theodore Schultz (Prêmio Nobel de 1974) e Gary Becker (Prêmio Nobel de 1992), ambos da Universidade de Chicago, desenvolveram o primeiro modelo econômico, destacando a educação como fator crucial no desenvolvimento socioeconômico.

Este artigo visa abordar a Teoria do Capital Humano por meio de um breve levantamento histórico, realizado por uma revisão bibliográfica de literatura publicada sobre o tema.

A Teoria do Capital Humano: De Adam Smith a Gary Becker

Em 1776, Adam Smith discorre pela primeira vez sobre o tema quando escreve “A Riqueza das Nações”, sem utilizar a terminologia, ele se aproxima do que futuramente passaria a considerado a teoria do capital humano. Nessa obra, o capital humano assume a forma de fator de produção, juntamente com o capital, sendo considerado o principal instrumento de mensuração do valor das mercadorias. A capacitação dos indivíduos é fonte de prosperidade, todavia deve ser iniciativa individual, pois Smith assume que o estado deve exercer poucas funções.

Para Adam Smith, a busca de conhecimento é fundamental para melhorar a condição do indivíduo, levando-o à prosperidade. No entanto, ele atribui poucas funções ao Estado, defendendo a liberdade individual na escolha profissional. Smith sustenta que o mercado de trabalho deve ser livre, permitindo aos indivíduos escolherem suas profissões sem restrições. Essa liberdade é regulada pela "mão invisível", que equilibra a oferta e demanda de empregos e mão de obra.

Alfred Marshall, em sua obra "Principles of Economics" (1890), abordou o conceito de capital humano. Ele afirmou que "toda riqueza consiste em coisas desejáveis" e classificou-a em dois grupos: bens materiais e imateriais. Os bens imateriais incluem qualidades e habilidades, que Marshall considerou como capital humano. Ao adquirir conhecimento, o trabalhador aumenta sua confiança e eficiência na execução de suas atividades laborais.

Alfred Marshall destaca também que, a falta de oportunidades entre crianças da classe trabalhadora limitava o potencial de descoberta de talentos excepcionais, prejudicando o desenvolvimento da riqueza nacional.

Karl Marx, em sua obra "O Capital" (1867), apresenta uma perspectiva crítica sobre o conceito de capital humano. Marx argumenta que a divisão do trabalho é utilizada pela classe dominante para explorar a força de trabalho assalariada e consolidar o poder dominante da burguesia. Ele critica Adam Smith por considerar suas ideias sobre oferta
e demanda de mão-de-obra como superficiais e ideologicamente motivadas pela classe burguesa. Para Marx, o investimento em educação é fundamental para transformar as relações sociais e empoderar os trabalhadores, permitindo-lhes assumir o controle do Estado.

A consolidação do conceito de capital humano recebeu contribuições significativas ao longo dos anos. No entanto, foi na década de 1960 que a Teoria do Capital Humano se consolidou como ramo da economia. O artigo Investment in Human Capital: A Theoretical Analysis, publicado por Gary Becker em 1964, marcou um divisor de águas, impulsionando definitivamente essa teoria.

Distinção e mensuração do capital humano

Schultz propõe uma dicotomia na mensuração do capital humano: abordagem quantitativa, focada na quantidade de indivíduos, e abordagem qualitativa, que considera fatores como conhecimento, habilidades e competências.

Para a formação do capital humano, Schultz leva em conta elementos como: recursos relativos à saúde, capacitação e nível de escolaridade, enquanto para medir o estoque de capital humano, o autor leva em conta três aspectos: anos de escola completados, anos escolares completados em diferentes momentos do tempo e os custos de educação como medida. Já a mensuração o do estoque autor considera: anos de escolaridade, trajetória educacional e custos de educação.

Becker conceitua capital humano como investimentos em capital intelectual e habilidades produtivas. Esses investimentos, realizados através da educação formal e informal, geram um estoque de conhecimentos e competências inerentemente ligados ao indivíduo, justificando seu caráter humano.

A colaboração teórica de Schultz e Becker foi fundamental para o desenvolvimento do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), uma ferramenta do PNUD para avaliar o progresso socioeconômico dos países.

A teoria de crescimento econômico depois de Schultz e Becker

O crescimento econômico é um tema fundamental na Economia. O modelo de Solow (1956), premiado com o Nobel em 1987, estabeleceu uma base teórica para entender o crescimento, destacando a importância dos fatores de produção (recursos naturais, capital e trabalho) na determinação do crescimento econômico entre países e regiões. Essa abordagem influenciou significativamente a teoria econômica subsequente.

A contribuição de Schultz e Becker destacou a importância do capital humano na teoria do crescimento econômico. Os modelos tradicionais de Solow (1956), centrados em capital físico e quantidade de mão-de-obra, foram complementados pela consideração da qualidade da força de trabalho, explicando melhor as disparidades de produtividade e crescimento entre países e regiões.

A partir de então, a teoria do crescimento econômico incorporou investimentos em capital humano como fator determinante, originando a Teoria do Crescimento Endógeno, que enfatiza a importância das variáveis internas, como inovação, educação e conhecimento.

A crítica de Sen

A Teoria do Crescimento Endógeno tem sido criticada por economistas marxistas e keynesianos, como Amartya Sen (Prêmio Nobel de 1998), que argumentam que a noção de "capital humano" reduz o ser humano a uma unidade de produção, ignorando dimensões sociais e políticas.

Sen destaca que o desenvolvimento de educação e saúde não deve ser visto apenas como meio de aumentar produtividade, mas também como direitos humanos fundamentais. Além disso, critica a Economia do Bem-Estar baseada na moral utilitária por apresentar limitações informacionais.