Economia
Empresa brasileira disputa marca iPhone na justiça
O ministro Alexandre de Morares, do Supremo Tribunal, pediu vista, na última sexta-feira (9/6), dos autos do julgamento de repercussão geral sobre a disputa entre as empresas de tecnologia Apple e Gradiente pela marca "iPhone". O caso vinha sendo debatido no Plenário Virtual. O pedido de vista suspende a análise, que se estenderia até esta segunda-feira (12/6).
A controvérsia existe porque a Gradiente, em 2000, pediu o registro da marca "Gradiente Iphone" no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O registro foi deferido somente em novembro de 2007 e concedido em janeiro do ano seguinte.
A Apple, que lançou o primeiro modelo do seu iPhone nos EUA em janeiro de 2007, tentou, mais tarde, registrar o nome do smartphone no Brasil, mas o pedido foi negado por causa da Gradiente. Assim, em 2013, a multinacional norte-americana contestou o registro da empresa brasileira na Justiça.
O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES) anularam parcialmente o registro de marca da Gradiente no INPI e afastaram o uso exclusivo do termo isolado "iPhone".
Tribunais superiores
A empresa nacional recorreu ao Superior Tribunal de Justiça e argumentou que o "i" minúsculo é apenas uma expressão indicativa de acesso à internet. Também alegou que a anulação do registro ocorreu somente pelo sucesso do produto da Apple. Em 2018, a 4ª Turma do STJ decidiu que a Gradiente não tem exclusividade sobre a marca "Iphone".
Além de acionar o STJ, a Gradiente também recorreu da decisão do TRF-2 ao STF e ressaltou que depositou sua marca quando a Apple sequer atuava no ramo de telefonia celular. Também explicou que deixou de usar a marca por um certo período devido a problemas financeiros, mas a retomou dentro do prazo legal.
O smartphone da Apple passou a ser vendido no Brasil em setembro de 2008. De acordo com a Gradiente, naquele momento, a empresa estrangeira deveria ter consultado o INPI sobre o uso da marca.
Já a Apple reconheceu que a palavra "iPhone" sempre foi usada como abreviação para os termos "internet" e "phone", mas alegou que, a partir de 2007, retirou tal palavra do uso comum e a transformou em uma indicação de origem de seus produtos.
Em 2020, o caso chegou a ser encaminhado ao Centro de Conciliação e Mediação do STF, mas o procedimento terminou no ano seguinte sem acordo entre as partes.
Corrente do relator
Antes do pedido de vista, os ministros Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso já haviam votado. Após a paralisação, Gilmar Mendes também antecipou seu posicionamento. Já Luiz Edson Fachin não participa do julgamento, pois se declarou suspeito.
Toffoli, que é relator do RE, votou pela reforma do acórdão do TRF-2 e propôs a tese de que o depósito de pedido de registro de marca não é afetado pelo uso posterior de um mesmo sinal distintivo por terceiros. Ele foi acompanhado por Gilmar.
Para eles, todos aqueles que depositaram pedidos de registro de marca após 2000 para o uso da expressão "Gradiente Iphone" em conjunto ou isoladamente deveriam obedecer a prioridade da Gradiente. Isso porque, conforme a Lei da Propriedade Industrial, após a concessão, não são admitidos novos registros.
O relator ressaltou que a Apple poderia ter pedido administrativamente a anulação do registro da Gradiente em até 180 dias a partir da certificação, mas isso não ocorreu.
O ministro também apontou que a empresa estrangeira nada fez entre 2008 e 2013. No último dia do prazo prescricional de cinco anos, finalmente ajuizou uma ação judicial. Por todo esse tempo, a expressão "Iphone" foi usada no Brasil sem qualquer oposição. Para ele, a Apple desrespeitou o registro da Gradiente durante tal período.
Outro ponto trazido pelo magistrado foi o fato de que a Apple investiu pesadamente para se apropriar exclusivamente da expressão "iPhone" em diversos lugares do mundo. A empresa chegou a adquirir marcas de terceiros com essa expressão em outros países, como EUA, Canadá e México.
"No sistema vigente, os requisitos para a concessão de patentes, de desenhos industriais e também de marcas devem ser verificados no momento da apresentação do registro, e não ao final do procedimento", explicou o relator. Ou seja, "a data a ser considerada é a do depósito, e não a da concessão do registro".
Quando a marca em questão foi deferida pelo INPI, o produto da Apple ainda não estava disponível no mercado brasileiro. Assim, segundo Toffoli, não havia "competição ou relação de concorrência entre as empresas no Brasil pelo mercado de smartphones".
Na sua visão, para que um sinal ou uma denominação ganhem um novo significado, precisam ser usados "no mercado em que se pretende criá-lo ou reconhecê-lo" — no caso concreto, o brasileiro, "perante o público consumidor nacional".
Divergências
Fux votou contra obedecer a prioridade da Gradiente, por entender que o direito de exclusividade sobre a marca não é absoluto. Ele ressaltou que a marca pode ser desvirtuada caso restrinja excessivamente a livre concorrência "sem a contrapartida do impulsionamento econômico que a exclusividade artificialmente criada busca incentivar".
O magistrado constatou uma "evidente evolução do produto", protagonizada pela Apple. Além do longo período entre o depósito e a concessão do pedido da Gradiente, ele destacou a "dinamicidade do mercado de tecnologia".
Por isso, defendeu o "uso de razoabilidade" para não "comprometer o próprio interesse social do instituto da propriedade intelectual" e não premiar quem "se manteve inerte por estar protegido pela morosidade no processo de análise da autarquia".
O ministro considerou que não seria correto "impedir o verdadeiro desenvolvimento de um produto de uso continuado e massivo, que segue sendo líder em seu segmento até os dias atuais".
Já Barroso, preliminarmente, votou por manter a decisão do TRF-2 que não admitiu o recurso extraordinário. Segundo ele, o caso trata de uma suposta violação a princípio constitucional de "caráter indireto". Para se admitir um RE, é necessária uma violação direta. As demais alegações, para o magistrado, eram genéricas.
Também segundo ele, a alteração da conclusão alcançada pelo TRF-2 exigiria uma reanálise de fatos e provas, o que é proibido pela Súmula 279 do STF.
O ministro ainda votou por cancelar a repercussão geral, por entender que o tema é altamente específico e "possui caráter estritamente patrimonial". Segundo ele, a hipótese dos autos é singular e sua repetição é improvável: "Não há tese jurídica a ser apreciada para além da realidade dos litigantes dos autos".
No mérito, Barroso manteve o acórdão do TRF-2. Ele entendeu que a proibição do uso isolado de um elemento de marca registrada não viola a Constituição quando há consagração mundial de um produto fabricado por concorrente.
Foi o que aconteceu no caso concreto, pois o TRF-2 excluiu a possibilidade de uso exclusivo do termo isolado "Iphone", mas não proibiu a expressão integral "Gradiente Iphone". Ou seja, "o registro se mantém hígido e eficaz na exata extensão em que foi requerido".
De acordo com o magistrado, o acórdão "não altera a dinâmica do mercado e a sua divisão entre as partes dessa demanda" e não causa "danos emergentes a nenhuma delas". Ele registrou que tal solução protege o consumidor, pois este associa o termo isolado "Iphone" ao produto da Apple.
*Conjur
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